domingo, 21 de agosto de 2011

Ceci N'Est Pas Le Paradis






Momochi — 百道 —, Fukuoka, 19.VIII.2011












       (Considerações soltas sobre a Cidade e costa envolvente)

       Não será novidade para ninguém — nem sequer para aqueles que não tiveram, até hoje, a oportunidade de passar uma curta temporada por cá — que a generalidade das grandes cidades do Japão se resume, hoje, a uma dispersão compacta de vastas extensões de betão armado e aço e vidro e viadutos, e um perder-de-vista de prédios atrás de prédios de gosto e proporções variadas, permeado aqui e ali por um ocasional parque verdejante, primorosamente cuidado no aspecto, no mais dos casos, isento de delito comum. Betão em riste por toda a parte, porém — veredicto de uma implacável indústria construtora. Massa informe e irremediavelmente descaracterizada e descaracterizante, por comparação a um certo Japão idílico de prospectos a acenar ao turista e bilhetes-postais do Kinkaku-JiNeverland
       Nada de insuspeito.
    Produto de décadas de galopante crescimento económico, aplacado somente há uma vintena de anos e sem promessa de novo fôlego à vista. Enfim. Nada que obste aos múltiplos encantos que ainda, aqui e ali, lhes reconhecemos e saudamos — ao País e suas cidades de nomeada.
      













   Fukuoka não será excepção. Nem neste, nem noutro contexto.
   Talvez um todo-nada mais habitável e esmerada na arquitectura da ambição.
   Ah! E, diria eu, obsessiva no superar dos seus limites físicos.















  Erigida sobre terra reclamada, Momochi nem sempre será este aparente cenário de invernal desolação, que hoje aqui trago ao escrutínio do vosso olhar. Porém este fim-de-semana os tons eram estes.

    Sim, já vi Momochi bem mais alegre e apelativa às lentes das câmeras fotográficas. Sexta-Feira que lá vai não tinha como re-maquilhar os retratos. E, de facto, uma tempestade à la Pukkelpop aproximava-se a passos largos, não deixando margem de manobra para uma demanda de melhores vistas.
















    Mas, como acima escrevia, Agosto aqui é sempre assim.
    Busca-se um ledo areal onde esticar as pernas e o céu desdenha.
   Fora de portas, a orla costeira deste Noroeste de Kyushu, não oferece nem muitas nem melhores alternativas ao ocioso viajante — praias em geral sujas, detritos 'made in Korea' a dar em barda à costa (o quasi-omnipresente Hangul nos rótulos das garrafas de plástico e outros dejectos espalhados pelos areais da prefeitura, não engana), águas escuras onde dançam medusas e alforrecas muitas, marés quietas, mar hostil. E aquele excesso de cimento armado por toda a parte — barreiras de protecção anti-tsunami, maciças estruturas de abrigo portuário, os viadutos, os semp'eternos viadutos de escoamento do tráfego automóvel a riscar cada kilómetro de costa... 







        Ele há, certamente, excepções a contraditar este relatório pouco ou nada abonatório de uma costa que se queria formosa e atractiva a um turismo tão doméstico quanto internacional, há décadas almejado por governos e privados deste país. 
     Porém, quiseram os Deuses que do mar esta terra sublimaram, que Kyushu-Norte trajasse estas vestes de velório pelo andar de cada Verão adentro e não há como o contrariar.






       Há sempre, e por piores que sejam as circunstâncias, quem não faça caso, e mesmo com um temporal de levar tudo atrás a anunciar-se no horizonte, por ali vá ficando a pescar de cana nos pontões de pedra, a olhar as nuvens em intimidante rodopio, ou a fazer castelos na areia.









     Quatro sorridentes senhoras em garridos trajes de veraneio solicitam-me que lhes tire um retrato às quatro, com recurso ao iphone de uma delas, e com a monumental Fukuoka Tower de fundo. Faço o melhor que posso para as ter proporcionadas contra o todo do imponente arranha-céus. Não tenho ângulo para tanto. Não tem importância, quem pediu dá-se por satisfeito com meio-edifício por paisagem.

      Quiz-me parecer que o céu lhes era indiferente.


























"This Is Not Paradise"    
*
“Ceci N'Est Pas Le Paradis” 
*   
「ここは天国ではない」





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2 comentários:

  1. Descreves de uma forma que quase é possivel sentirmos-nos ai...
    Parabéns

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  2. Magnífica reportagem, NBJ! Por momentos senti-me aí e passei-me no espaço atrvés do que descreveste... e quase vi pelos meus olhos! Muito bom! Obrigado! :)

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