Momochi — 百道 —, Fukuoka, 19.VIII.2011 |
(Considerações soltas sobre a Cidade e costa envolvente)
Não será novidade para ninguém — nem sequer para aqueles que não tiveram, até hoje, a oportunidade de passar uma curta temporada por cá — que a generalidade das grandes cidades do Japão se resume, hoje, a uma dispersão compacta de vastas extensões de betão armado e aço e vidro e viadutos, e um perder-de-vista de prédios atrás de prédios de gosto e proporções variadas, permeado aqui e ali por um ocasional parque verdejante, primorosamente cuidado no aspecto, no mais dos casos, isento de delito comum. Betão em riste por toda a parte, porém — veredicto de uma implacável indústria construtora. Massa informe e irremediavelmente descaracterizada e descaracterizante, por comparação a um certo Japão idílico de prospectos a acenar ao turista e bilhetes-postais do Kinkaku-Ji e Neverland.
Nada de insuspeito.
Produto de décadas de galopante crescimento económico, aplacado somente há uma vintena de anos e sem promessa de novo fôlego à vista. Enfim. Nada que obste aos múltiplos encantos que ainda, aqui e ali, lhes reconhecemos e saudamos — ao País e suas cidades de nomeada.
Fukuoka não será excepção. Nem neste, nem noutro contexto.
Talvez um todo-nada mais habitável e esmerada na arquitectura da ambição.
Ah! E, diria eu, obsessiva no superar dos seus limites físicos.
Momochi [百道] é, dest'último aspecto, senão o mais acabado exemplo, um dos mais recentes e significativos.
Erigida sobre terra reclamada, Momochi nem sempre será este aparente cenário de invernal desolação, que hoje aqui trago ao escrutínio do vosso olhar. Porém este fim-de-semana os tons eram estes.
Sim, já vi Momochi bem mais alegre e apelativa às lentes das câmeras fotográficas. Sexta-Feira que lá vai não tinha como re-maquilhar os retratos. E, de facto, uma tempestade à la Pukkelpop aproximava-se a passos largos, não deixando margem de manobra para uma demanda de melhores vistas.
Mas, como acima escrevia, Agosto aqui é sempre assim.
Busca-se um ledo areal onde esticar as pernas e o céu desdenha.
Fora de portas, a orla costeira deste Noroeste de Kyushu, não oferece nem muitas nem melhores alternativas ao ocioso viajante — praias em geral sujas, detritos 'made in Korea' a dar em barda à costa (o quasi-omnipresente Hangul nos rótulos das garrafas de plástico e outros dejectos espalhados pelos areais da prefeitura, não engana), águas escuras onde dançam medusas e alforrecas muitas, marés quietas, mar hostil. E aquele excesso de cimento armado por toda a parte — barreiras de protecção anti-tsunami, maciças estruturas de abrigo portuário, os viadutos, os semp'eternos viadutos de escoamento do tráfego automóvel a riscar cada kilómetro de costa...
Ele há, certamente, excepções a contraditar este relatório pouco ou nada abonatório de uma costa que se queria formosa e atractiva a um turismo tão doméstico quanto internacional, há décadas almejado por governos e privados deste país.
Porém, quiseram os Deuses que do mar esta terra sublimaram, que Kyushu-Norte trajasse estas vestes de velório pelo andar de cada Verão adentro e não há como o contrariar.
Há sempre, e por piores que sejam as circunstâncias, quem não faça caso, e mesmo com um temporal de levar tudo atrás a anunciar-se no horizonte, por ali vá ficando a pescar de cana nos pontões de pedra, a olhar as nuvens em intimidante rodopio, ou a fazer castelos na areia.
Quatro sorridentes senhoras em garridos trajes de veraneio solicitam-me que lhes tire um retrato às quatro, com recurso ao iphone de uma delas, e com a monumental Fukuoka Tower de fundo. Faço o melhor que posso para as ter proporcionadas contra o todo do imponente arranha-céus. Não tenho ângulo para tanto. Não tem importância, quem pediu dá-se por satisfeito com meio-edifício por paisagem.
Quiz-me parecer que o céu lhes era indiferente.
"This Is Not Paradise"
*
“Ceci N'Est Pas Le Paradis”
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「ここは天国ではない」
✹✹✹
Descreves de uma forma que quase é possivel sentirmos-nos ai...
ResponderEliminarParabéns
Magnífica reportagem, NBJ! Por momentos senti-me aí e passei-me no espaço atrvés do que descreveste... e quase vi pelos meus olhos! Muito bom! Obrigado! :)
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