domingo, 24 de outubro de 2010

Luzes De Papel









23.10.2010

Palavras para quê?

























































*"Sereno aguarda o fim que pouco tarda.
Que é qualquer vida? Breves sóis e sono.
Quanto pensas emprega
Em muito não pensares."








































































"Vive sem horas. Quanto mede pesa,
E quanto pesas mede.
Num fluido incerto nexo, como o rio
Cujas ondas são ele,
Assim teus dias vê, e se te vires
Passar, como a outrem, cala."
































"Uns com os olhos postos no passado, 
Vêem o que não vêem; outros,  fitos
Os mesmos olhos no futuro, vêem
O que não pode ver-se"










"Porque tão longe ir pôr o que está perto —
A segurança nossa? Este é o dia,
Esta é a hora, este o momento, isto
É quem somos, e é tudo."











"Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto
Em que vivemos, morreremos. Colhe
O dia, porque és ele."










"Súbdito inútil dos astros dominantes, 
Passageiros como eu, vivo uma vida
Que não quero nem amo,
Minha porque sou ela,"











"No ergástulo de ser quem sou, contudo,
De em mim pensar me livro, olhando no alto
Os astros que dominam
Submissos de os ver brilhar."











"Antes isto que a vida
Como os homens a vivem,
Cheia da negra poeira
Que erguem das estradas"













































"Vastidão vã que finge de infinito
(Como se o infinito se pudesse ver!)  —
Dá-me ela a liberdade?
Como, se ela a não tem?"







"Flores que colho, ou deixo,
Vosso destino é o mesmo.


"Via que sigo chegas
Não sei aonde chego


"Nada somos que valha,
Somo-lo mais que em vão."











"A flor que és, não a que dás, eu quero.
Porque me negas o que te não peço.
Tempo há para negares
Depois de teres dado.
Flor, sê-me flor! Se te colher avaro
A mão da infausta esfinge, tu perene
Sombra errarás absurda
Buscando o que não deste."










"Frutos, dão-os as árvores que vivem,
Não a iludida mente, que só se orna
Das flores lívidas
Do íntimo abismo.
Quantos reinos nos seres e nas coisas
Te não talhaste imaginário! Quantos,
Com a charrua,
Sonhos, cidades!
Ah, não consegues contra o adverso mito
Criar mais que propósitos frustrados!
Abdica e sê
Rei de ti mesmo."









"Ninguém a outro ama, senão que ama
O que de si há nele, ou é suposto.
Nada te pese que não te amem. Sentem-se
Quem és, e és estrangeiro.
Cura de ser quem és, amam-te ou nunca.
Firme contigo, sofrerás avaro
De penas."






































"Quero ignorado, e calmo
Por ignorado, e próprio
Por calmo, encher meus dias
De não querer mais deles."







"Aos que a riqueza toca
O outro irrita a pele
Aos que a fama bafeja
Embacia-se a vida."







"Aos que a felicidade
É sol, virá a noite.
Mas ao que nada 'spera 
Tudo que vem é grato."


















"Aqui neste misérrimo desterro
Onde nem desterrado estou, habito,
Fiel, sem que queira, àquele antigo erro
Pelo qual sou proscrito.
O erro de querer ser igual a alguém
Feliz, em suma — quanto a sorte deu
A cada coração o único bem






De ele poder ser seu."













*Ricardo Reis,    Odes várias.

3 comentários:

  1. Sem palavras fiquei eu...que belas as odes de Ricardo Reis misturadas com estas luzes de papel...imagens lindas que...não sei o que são.
    Um festival? Uma cerimónia?
    Beijos

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  2. Olá Loli.

    O 'Hakata Toumyou' é uma breve celebração local, cujas origens desconheço, levada a cena todos os anos num certo Sábado de Outubro e circunscrito à zona de Hakata — centro de Fukuoka, onde eu habito — e no qual os residentes acendem velas que colocam dentro de pequenos invólucros de papel criando um estranho e encantador efeito que emprestam à noite....
    As ruas e os passeios, e ao longo das Avenidas, toda a Hakata se enche destas pequenas e maravilhosas "luzes de papel", como eu lhes chamo.

    Esta primeira série de fotos (vêm aí mais a caminho) foi feita desde a varanda do meu apartamento, defronte de cujo prédio se acha esse largo terreiro — outrora parte de uma escola da qual só resta o Taiikukan (ginásio) mesmo ao lado — onde todos os anos é ensaiada uma imagem diferente feita com as tais "toumyou" (pequenas lamparinas) — veja os "quadros" dos anos passados, 2008 e 2009, que estão em 'link' no post anterior — e há outros terreiros, por toda esta cidade de Hakata, onde diferentes imagens são dispostas.

    Do alto da minha varanda, tenho anualmente o privilégio de uma nova "instalação" ao dispor da minha câmera, pelo menos enquanto a pressão da construção civil local não reclamar este breve e cobiçado pedaço de terra — consta, de qualquer modo, que o ano que vem, o mesmo já cá não estará, porque irão sobre ele edificar uma nova escola, desta feita para crianças deficientes.
    Mas o Hakata Tomyou não vai desaparecer, e esteja eu por cá, continuarão aqui a calhar fotos, todos os anos.
    Obrigado pelo olhar atento.

    Xi'Coração,
    NBJ

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  3. Ricardo Reis um heterónimo pessoano que admiro. Pessoa é o meu poeta de eleição!
    Só hoje pude ler com atenção.
    Parabéns por este e o post posterior!
    Boa noite.

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