sexta-feira, 13 de maio de 2011

Às Armas (Ainda de Kyoto — Outras: Arcos e Flechas)










        É um tema há muito em falta, aqui.

   Há já muito tempo que planeava trazê-lo ao vosso convívio e apreciação.
     Porém, um sem-número de razões impediu a sua estreia, aqui, até esta data.

        É esta a hora. 
      A minha recente passagem pelo Kyoto Enbu Taikai [京都演武大会] dá-lhe agora o mote e não haverá lugar a mais adiamentos sine die.



























    O Kyūdō, antiga arte de tiro com arco japonês, é, provavelmente, logo a seguir ao Kendo, a segunda Budō [武道], ou Arte de Armas/Arte Marcial, com maior implementação e vitalidade no Japão contemporâneo — não incluindo nesta avaliação Artes Marciais ou combativas, como o Karate, em todo o caso, meritórias da nossa maior reverência — que não incluem o treino com armas e respectivo exercício, directamente derivadas das antigas práticas da classe militar do Japão feudal: a dos Bushi [武士] ou Samurai [侍]. 










       É comum, entre os visitantes menos familiarizados com o Japão, sua cultura, história e respectivos legados, ser-se surpreendido numa viagem de estreia a uma qualquer grande cidade deste país, ora por largos, amplos grupos de pessoas de todas as classes etárias, ora por pedestres isolados, circulando pelas ruas de Tokyo, Osaka, Kyoto ou Hakata, empunhando os longos Yūmi (弓) ou Daikyū (大弓), ora em trajes comuns, ora orgulhosa e uniformemente envergando as suas hakama e kyudogi, com a solenidade e pose próprias dos atributos reconhecidos à antiga classe castrense de Yamato e como se em pleno Período Edo estivéssemos, não fosse esta uma arte ainda hoje levada muito a sério e não somente pelos seus praticantes, mas bem assim, e em geral, por toda a sociedade nipónica dos nossos dias, que insiste em preserva-la como opção de excelência enquanto actividade extra-curricular no seu sistema educativo.







   Aos que, de entre vós, calhe a chance de passar por Kyoto por altura da primeira semana de Maio, a possibilidade de um tal, fortuito, encontro, com entusiastas desta ancestral Arte de Armas, tão ao gosto do País dos Kami, mais que quadriplica: virtude da tradição do Kyoto Enbu Taikai nessa semana, ele há Kyūdōka por toda a parte e para surpresa dos muitos turistas estrangeiros presentes, por estes dias, à antiga capital do Império, por distintíssimos motivos e interesses e desconhecendo a natureza, escala e  dimensão desta nobre e antiga disciplina.








    






















































































































































































































































































































  À semelhança do que observamos em presença de outras Budō [武道] contemporâneas — e tomando aqui por referência maior a 'arte-irmã' do Kendo, o Iaido [居合道] —,  no que concerne ao Kyūdo, constatamos pesar, sobre o mesmo, um nível de exigência extremo no que respeita à dimensão estético-formal da respectiva prática — posturas rígidas, alternadas por movimentos meticulosamente cadenciados, via de regra lentos e meditativos, e exibindo um rigor incorrupto no que se refere ao domínio de um certo estado reflexivo marcado por uma  exímia e inquebrável concentração mental.









   Uma certa corrente interpretativa desta realidade aponta como raiz histórica da mesma, o facto de que, pela segunda metade do Período Edo (Século XVIII da nossa era), perante um Japão plenamente pacificado e onde, por consequência, as artes de armas tendiam a perder a sua importância de outros tempos, a classe guerreira dominante viu-se perante a necessidade de recorrer a expedientes tão rebuscados quanto diversos, com vista a justificar a respectiva hegemonia social sobre a restante população (os Samurai representavam tão-só cerca  de 2,5 % da população do Japão de então) e entre estes pontificou um crescendo dessa dita exigência estético-cerimonial nas artes da nobreza, que passou a identificar nessa demanda de rigor para-protocular, o elemento erudito, refinado, aristocrático, próprio de um certo ascendente de classe que teria por fim imprimir uma forte e clara destrinça entre os que mandavam e os que obedeciam: as Budō e o seu domínio, passavam assim da sua natureza originária de disciplinas combativas puras, a mecanismo essenciais de afirmação social.









   E ainda que esta interpretação da natureza socio-cultural do Kyūdō,  bem assim como do Iaido e outras artes de armas vivas e presentes no Japão hodierno, possua a sua quota de atendibilidade de um ponto de vista histórico, tal não obsta a que nestas disciplinas indentifiquemos uma mais persistente e determinante influência do Budismo, e em particular do Zen, enquanto força cultural e filosófica dominante no Japão de ontem como de hoje, e peça fundamental para a compreensão da psique nacional Nipónica.
















      Em qualquer recurso, é inegável o facto de estarmos perante uma das mais belas e profundas disciplinas tradicionais de Yamato. Manifestamente distinto de outras práticas de tiro com arco aquém e além ilhas, o Kyūdō persiste, ainda hoje, em exercer um fascínio mesmerizante sobre quem quer que o contemple à distância de um simples olhar.


      É com grande satisfação que hoje vos proponho mais  esta colecção de retratos de um outro Japão.



        Conto acertar no alvo!... 



















































































































































































































































.... mas tão-só o largar da flecha...


























































































































































































































































































































































































































...E em de despedida...







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3 comentários:

  1. Algo que sempre tive curiosidade em experimentar....talvez um dia quem sabe...

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  2. Custoso.
    Bastante mais custoso que aquilo que eventualmente poderá parecer.
    Creio que deixei aí algures no artigo, um link para um pequeno vídeo-doc. onde surge um certo cavalheiro que anda há décadas a lutar por dominar o básico desta arte. As mãos tremem-lhe que nem varas, e a sensação que a imagem transmite é de que os 'yumi' são instrumentos realmente muito difíceis de manusear.
    Eu prefiro ater-me ao meu Kendo.
    Kyudo, só com os olhos. ☺

    Bjx.

    NBJ

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  3. Se eu morasse no Japão, praticaria. Deixa uma postura muito boa e bonita :)

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