quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Da Euforia à Hecatombe (II)






Singapura conquistada, Fevereiro de 1942

  • Os Anos da Euforia (II.a)



计划*

"Ao optardes pela guerra, primeiro calculai-lhe os custos (...)
O fim último da guerra não é mais que a vitória.
Se est'última se atrasar, as armas perderão aprumo 
e o moral dos homens dissipar-se-á (...)
E ao avançar contra múltiplas cidades, a força dos exércitos dispersar-se-á.
Em guerras que se arrastam, os recursos comuns de um estado não hão de bastar.
Quando as armas perdem aprumo e o ardor dos homens esmorece,
quando as forças e os tesouros se esgotam,
outros estados na vizinhança cuidarão de tomar vantagem 
da vossa dificuldade em prosseguir.
E mesmo que vos precaveis pela prudência de sábios e leais conselheiros,
não haverá plano que heis de conduzir com sucesso 
e pelos tempos que se avizinhem.
E se heis de ver retumbantes vitórias em guerras breves,
 jamais as vereis em guerras que se arrastam.
Pois que nunca houve guerra que se arrastasse,
que estado, fosse ele qual fosse, dela colhesse proveito."






SUN TZU, "A Arte da Guerra" [孫子兵法], 
Capítulo II: "De Como Fazer A Guerra" [作戰]*   











   Antes que possamos prosseguir — e porque as imagens que estimulam o espírito de reflexão, uma vez destituídas da substância dos factos, se arriscam, assim, a promiscuir-se com a pornografia própria da crueza que lhes assiste, e, desse modo, a reduzir-se ao mero e indolente espectáculo da História feita entretenimento —, façamos então uma revisão da matéria dada.

     Para um país parco em recursos naturais necessários a uma industralização galopante, no início do último século, o controle político e militar de extensas áreas onde os mesmos abundassem, surgia como a opção óbvia para um Japão que, em menos de cinquenta anos, se promovera directamente, e num esforço sem paralelo na História, de sociedade feudal e atrasada a estado plenamente industrializado e na linha das grandes potências mundiais do seu tempo. 

   As grandes vitórias militares da Primeira Guerra Sino-Nipónica de 1894-95 e da Guerra Russo-Nipónica de 1904-1905 — guerras breves e categoricamente vencidas mediante três, quatro golpes certeiros e decisivos infligidos ao inimigo — haviam aberto as comportas de uma ambição maior e mais audaz, no sentido de uma indisfarçada expansão territorial no continente asiático e até onde os meios político-diplomáticos, militares e navais ao dispor do Império do Sol Nascente lhe permitissem estender a sua esfera de controle e influência. 

   As sementes da ideia de uma 'Grande Esfera de Co-prosperidade para a Ásia Oriental' (大東亜共栄圏, Dai'Tō-A Kyōeiken) — fórmula via de regra atribuída a Matsuoka Yosuke,  que  daria o leitmotiv para o ímpeto agressivo das décadas de 30 e inícios de 40,  e a seu tempo re-interpretado como pouco mais que um rebuscado eufemismo para um ambicioso império ultramarino a estender-se da Ásia-Pacífico ao Índico e sob as rédeas do Trono do Crisântemo — haviam, pois, sido semeadas em plena viragem do século, graças à espectacular ascensão do Japão de Meiji enquanto potência maior, militar e economicamente falando. 

   Já os avanços do Exército Kwantung (à revelia da vontade expressa de Tóquio em sentido inverso) sobre a Manchúria, a partir de 1928, e em plena guerra aberta (ainda que não declarada) com o regime Nacionalista de Chiang Kai'shek desde o Incidente de Mukden em Setembro de 1931, haviam, desde o seu início, se visto ensombrados pelo alvor de uma nova ordem mundial pós-Grande Guerra de 1914-18, que ao distante e distinto Japão impusera todo um quadro institucional inteiramente novo e agora notoriamente incompatível com as suas reivindicações expansionistas no continente Asiático — processo iniciado com o Acordo Lansing-Ishii de 1917, ainda em plena I Guerra Mundial, e a adesão ao Convénio da Liga das Nações de 1919 (em cujo texto os representantes do Japão, Makino e Chinda, insistiriam na inserção de uma cláusula que expressamente reconhecesse um princípio geral de igualdade racial entre povos, e paralelamente ao princípio/cláusula referente à igualdade religiosa, proposta esta  liminarmente rejeitada por Woodrow Wilson e a delegação Norte-Americana... — e prosseguido com as Conferências e Tratados Navais de Washington (1921-22, Tratado das Cinco Potências em particular) e Londres (1930), de permeio com o Pacto Kellogg-Briand (de 1928, que instituiria a noção jurídica do que viria a designar-se por Crimes contra a Paz), e os Tratados das Quatro e das Nove Potências (neste último, Portugal figurando como signatário e enquanto detentor de interesses específicos na China [Macau]).

      A crescente intransigência por parte das elites militares e políticas nipónicas em permitir que aquilo que agora denunciavam como uma 'intolerável e arrogante ingerência anglo-americana nos assuntos da Ásia', obstasse à legitimidade das suas ambições na Manchúria Interior — território vasto e pródigo em matérias-primas, e desde 1931 seccionada da grande China pelo Exército Kwantung, formalmente re-baptizado Manchukuo e confiado então a um governo fantoche nominalmente tutelado por um monarca na pessoa de Pu'Yi, o último Imperador da Dinastia Qing, a dinastia Manchu, última linhagem imperial a residir na Cidade Proibida, em Pequim, e a reinar sobre o Império do Meio, e até à proclamação da República da China em Janeiro de 1912 — arrastaria o Japão para o acumular das tensões internas e externas que desembocariam no processo conducente à Guerra do Pacífico

    O documentário que se segue, em cinco breves partes, resume, com louvável rigor e sem tomar partido ou aplaudir causas, assim me parece, os factos de maior relevância para uma compreensão sucinta dos termos que estenderam um conflito em particular opondo inicialmente o Japão à China, ao palco maior da II Guerra Mundial. Foi, salvo melhor opinião, a escolha apropriada.

   Da Grande Muralha a Rabaul e Guadalcanal, do Hawaii a Madagáscar — limite máximo do progresso militar Japonês, em 1942 —, os anos da euforia, das vitórias rápidas, porém inconclusivas, que arrastariam o Japão para uma cruel e agonizante guerra suicida contra os E.U.A, o Império Britânico, a França, a Holanda, ainda e sempre a China de Chiang e Mao, e ao cair do pano, last but not least, a U.R.S.S. ...

    À vossa apreciação.

   (... e a continuar)































*Do Mandarim arcaico  para 'Cálculo'
             — embora seja o Capítulo I da obra de referência atribuída a Sun Tzu, a ser via de regra interpretado como se tratando da parte referente ao tema da planificação da guerra (始计), é no Capítulo II que encontramos o segmento supra citado e a generalidade das considerações relativas ao planeamento do que hoje entendemos como a essência de uma economia de guerra.









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2 comentários:

  1. Caro Luís, finalmente consegui ter tempo para ver todos os vídeos. Excelente escolha. Aguardo o restante.

    Abraço

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  2. Obrigado pelo interesse, Ariel.
    Por agora, e para ser franco, não estou com grande vontade de prosseguir com este tema, mas voltaremos a ele, com certeza, assim ele venha a propósito de qualquer coisa que se nos cruze no caminho.

    Em qualquer recurso, não o vamos deixar por aqui, até porque o tema se impõe de per si, vez por outra.

    É estar atento,
    Bom fim de semana,

    NBJ

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