segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Urakami ontem, Urakami hoje





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Sobre Nagasaki, Sweeney e Ashworth não podiam perder tempo a decidir-se: afinal, desfalcado de uns preciosos seiscentos galões de fuel, que pouco mais deixava para o troço de regresso a Tinian (se desse sequer para lá chegar próximo, pois que, nas circunstâncias, o cenário mais optimista seria o de uma aterragem de emergência e depósitos sêcos algures em Okinawa...), somado à quase uma hora (de fuel e nervos) esbanjada no ar, sobre Yakushima, em espera pelos seus dois parceiros de missão, o 'The Great Artiste' e o 'Big Stink', e ao sobrepêso do 'Gorducho' que dormia, silente, esfíngíco, tenso e ameaçador, no seu frágil ventre de metal, a atrasar-lhe a marcha e a expô-lo a eventual fogo inimigo, ao 'Bockscar' urgia desenvencilhar-se sem mais delongas da sua sinistra carga...

Foi por volta das 10:55 — right there and then —, sobre Urakami, Nagasaki.
Ali, a escassos quarteirões dos estaleiros navais da Mitsubishi/MHI, 'justificativo' da preferência pelo alvo em causa. Uma brecha no céu... Tanto basta.


A Catedral de Urakami, aberta aos fiéis de Cristo em 1914, após quase dois séculos e meio de sofrimento na clandestinidade da sua reduzida e'inda assim tenaz comunidade de 'Kakure Kirishitan' [隠れキリシタン], entre exílios forçados, martírios e humilhações de toda a ordem, a somar a mais quatro décadas d'outras tantas dificuldades na obtenção de meios e financiamento para a sua edificação — suprimida a proibição da Fé Cristã em plena Meiji Jidai [明治時代] —, calhou achar-se, naquela fugaz manhã de Agosto, ali mesmo sob a trajectória do projéctil...


O resto são as imagens que as câmeras da época registaram...





✽ ✣ ✽

...Mas Urakami não morreu.

Urakami vive.

E Nagasaki vive.

E é a Vitória da Vida que hoje celebramos.


























4 comentários:

  1. Bom post e belas fotos.
    Nagasaki, tal como Hiroshima, não deve ficar esquecida, pois sofreu uma dos maiores horrores da história moderna.
    É pena que o mundo não tenha aprendido essa lição...

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  2. É pena sim, meu caro.
    Quem apanhou bem o "humor" (negro, tão negro...) do que aqui se passou foi Kubrick no seu genial "Dr. Estranhoamor". Lembras-te?
    A (re)ver, recordar e reflectir.

    "Mein Führer! I CAN WALK!"

    Um Grande Abraço,
    NBJ

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  3. Ainda hoje fico fora dos eixos, quando leio os disparates que leio por aí. Vá até ao Blasfémias e veja o tom da burrice e maldade.

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  4. Meu Caro Nuno:

    Olhe. Diz-me a experiência que não vale a pena entrar em diálogo com gente estúpida, quadrada e casmurra, entrincheirada em lugares-comuns apropriados pela propaganda, e menos ainda com esses que se excitam logo ao menor sinal de contestação das falácias que apregoam como verdades inabaláveis.
    Ainda lá passei como o Nuno me desafiou, mas ao passar em revista aquele anedotário — que naturalmente eu não tenho tempo para estar a ler aquilo tudo de uma ponta à outra (há pouco ia em 86 tiradas...) —, só me veio à mente a imagem daqueles três macacos do Templo de Toshogu [東照宮] em Nikko: o macaco-que-não-ouve ['kikazaru' — 着か猿], o macaco-que-não-vê ['mizaru' — 見猿], e neste contexto eu preferiro ser o terceiro macaco — o-que-não-diz ['iwazaru' — 言わ猿]...
    De todo o modo, não sou académico da especialidade em causa, e também eu reconheço que em certas matérias tendo a falar mais com o coração que com a cabeça, e assim prefiro conter-me...
    Em todo o caso, a cada ano que passar, e assim se me permita manter este espaço e aqui escrever, este assunto tornará aqui, pontualmente, nas devidas datas. Quem quiser, que cá venha ler, debater, comentar, rebater. Aqui estarei, para quem vier.

    Obrigadíssimo pela visita,
    Um Grande Abraço,

    NBJ

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