encontra-se ainda em fase de pós-produção
e é já aguardado com alguma expectativa no Japão.
"Corações Sujos", a cargo do realizador Vicente Amorim, conta, no seu elenco, com os préstimos de alguns destacados actores nipónicos da actualidade, mas esta parece não ser necessariamente a componente mais susceptível de galvanizar a curiosidade de colunistas e de mobilizar o público japonês.
O novo filme de Vicente Amorim traz a lume uma página trágica da história recente do Brasil, desenrolada no seio de uma das suas mais destacadas comunidades imigrantes, a linhagem nipo-descendente concentrada sobretudo no Estado de São Paulo, e os efeitos que a derrota do Império do Sol Nascente na II Guerra Mundial surtiram na sua consciência e vida colectivas.
A história dos eventos dramatizados neste filme terá sido já objecto de várias obras literárias publicadas e disponíveis ao público, de entre as quais se destaca o romance homónimo de Fernando Morais que serve de inspiração a esta nova versão cinematográfica, e, no Japão, a investigação do mesmo caso levada a cabo por Takagi Toshiro, intitulada "Kyoshin ['Credo Fanático'] — Violência Política entre a Comunidade Imigrante Nipónica no Brasil" [「狂信-ブラジル日本移民の騒乱」— "Kyoshin — Braziru Nihon Imin No Soran" ]. No entanto o passar das décadas sobre o desfecho do incidente em causa incumbiu-se de o relegar para o foro daquelas muitas 'obscuridades' que a História acaba por arquivar longe da memória comum.
"Corações Sujos" narra a história da "Shindo Renmei" [臣道連盟] — a “Liga da Via dos Súbditos” —, uma organização nacionalista japonesa surgida em São Paulo logo após o desfecho da Segunda Guerra Mundial, que nos dois anos seguintes tratou de semear o terror entre a comunidade japonesa no Brasil, e em particular na região do Estado de São Paulo. Os seus seguidores acreditavam piamente na ideia de que a notícia da rendição do Japão em Agosto de 1945 não passava de um golpe da propaganda aliada destinado a debilitar o moral e o orgulho dos filhos de Yamato, recusando-se a aceitar a realidade da derrota.
Com a entrada do Brasil na Guerra em 1943, alinhado com a causa Aliada, a comunidade japonesa — agora conotada com o inimigo — é proibida de editar jornais ou quaisquer outras publicações, ou de fazer circular informação, na sua língua, vendo-se assim privada do acesso a notícias e informações fidedignas que lhe permitissem seguir o curso do conflito além-mar com assiduidade e isenção.
Deste modo, em poucos meses, os mais de 200 mil imigrantes que viviam no Estado de São Paulo viram-se subitamente divididos em duas facções: os ditos 'kachigumi', [勝ち組] ou “crentes na vitória” arregimentados pela Shindo Renmei [S.R.] e apoiados por, estima-se, cerca de 80% da comunidade japonesa no Brasil, e os 'makegumi' [負け組], ou “derrotistas”, apelidados de “corações sujos” pelos militantes da S.R.
Organização militarista e fanaticamente leal às tradições do seu país, a Shindo Renmei declarou guerra aos ditos “corações sujos”, a quem acusava de traição à pátria – tão-só por estes se resignarem ao facto de que o Japão fora irremediavelmente derrotado na guerra... – e passam então a perseguir, intimidar e a assassinar os odiados “derrotistas”.
Por mais de um ano, entre 1946 e 1947, os 'operacionais' da S. R. calcorrearam o Estado de São Paulo levando a cabo dezenas de atentados que implicaram a morte de pelo menos 23 imigrantes e fizeram perto de 150 feridos.
Os algozes encarregues de promover a "justiça" dentro da colónia e sanar a honra do Japão eram apelidados 'tokkotai' [特攻隊] — não surpreendentemente, o nome pelo qual eram também designados os membros dos célebres Esquadrões Especiais de Ataque [Shinpu Tokubetsu Kōgeki'Tai — 神風特別攻撃隊], vulgo 'Kamikaze' [神風].
Tratando-se, na sua esmagadora maioria, de 'vingadores' sem qualquer experiência de luta ou acções violentas, os tokkotai' davam caça aos "traidores do Japão", filhos da pátria que confessavam publicamente não sustentar quaisquer dúvidas acerca da derrota do seu país. Tratava-se de um mero acerto de contas entre a população nipo-descendente. Os brasileiros eram, no mais dos casos, mantidos à margem, e os 'tokkotai', no mais das vezes, acabavam por entregar-se voluntária e espontaneamente às autoridades, logo que consumavam a execução dos seus alvos.
Ainda assim, entre os 'tokkotai', destacou-se um 'comando' formado por sete 'crentes' oriundos da cidade de Tupã, S.P., os quais chegaram a ser presos, acusados da tentativa de assassinato de um militar brasileiro, e por este, alegadamente, ter cometido um crime passível somente de ser expiado com a morte: ultrajar o Hinomaru, a bandeira nacional do Japão. Uma vez libertados, os membros deste 'comando' foram recebidos como heróis na colónia japonesa de Marília, São Paulo.
Entre o elenco de "Corações Sujos" destaca-se a presença de Tsuyoshi Ihara, actor japonês de ascendência coreana, que o grande público internacional conhece já do notável "Cartas de Iwo Jima" de Clint Eastwood, película na qual interpretou o papel do Barão Nishi Takeichi.
Cheguei até aqui através do blogue ''O Homem Que Sabia Demasiado'', e encontrei uma agradável surpresa aqui no seu espaço.
ResponderEliminarTenho uma ligação muito grande com o Japão.
Muito obrigado!
Obrigado eu, B.A.
ResponderEliminarÉ sempre uma imensa alegria ter por cá uma presença nova.
Volte sempre!
NBJ
Benvindo ao meu espacinho, também ;)
ResponderEliminarVoltarei, aliás já sou seguidora.
Um abraço
Blue